Descrições são muito importantes no RPG. É através delas que o cenário ganha vida. Confira algumas dicas para narrar boas descrições!
Imagem: Jaka Prawira
Como narradores de RPG, uma das grandes capacidades que precisamos desenvolver é a descrição. Em outras palavras, esta é a principal ferramenta do narrador e da narradora para criar uma imagem na mente do jogador. É através da descrição que o jogador recebe ferramentas para projetar sua personagem no cenário e envolvê-lo na história. No entanto, as descrições no RPG não são uteis apenas para criar imagens visíveis na mente dos jogadores. Assim, elas também podem revelar características importantes sobre o ambiente, as pessoas, os comportamentos, e até mesmo sensações.
Existem muitas técnicas que podem nos ajudar a fazermos boas descrições no RPG. E existem diversos tipos e estilos de descrições; assim como cada mestre tem seu estilo de narração. Mas independente da técnica que você usar – descrições objetivas e diretas ou subjetivas – você deve entender quais os efeitos que o estilo que você escolheu causa. Se seu objetivo é sempre trazer melhores experiências para seus jogadores, é muito importante ter ferramentas adequadas para conduzir esta experiência. Descrição é – se não a mais – uma das ferramentas mais importantes que um mestre pode dispor.
Por isso, abordaremos o tema aqui levando em consideração algumas das diversas técnicas que existem nas descrições de livros e como podemos aprender com elas para enriquecer nossa narração. Livros são uma fonte inesgotável de referências descritivas para nossas mesas. Então, leia! E se você está começando, acho que este texto pode te ajudar.
Para começar, tenha essas duas coisas em mente
Esta primeira parte terá os critérios básicos para qualquer dica que for dada neste texto. Assim, em caso de dúvida, volte aqui quantas vezes for necessário.
1 – Evite informações redundantes
Redundância é usar muitas palavras para expressar algo que poderia ser dito com menos palavras. É insistir numa mesma ideia. Portanto, informações redundantes são as informações que se repetem sem necessidade durante as descrições.
Às vezes, por falta de vocabulário, nervosismo, ou despreparo, ficamos confusos em encontrar a melhor forma de trazer aquela imagem à mesa. Como resultado, nos perdemos repetindo conceitos sobre o que estamos tentando descrever e acabamos tornando as descrições cansativas. Evitar informações redundantes pode ser um divisor de águas para o engajamento dos jogadores na sua mesa.
2 – Evite informações irrelevantes
As informações irrelevantes são as que não tem real importância para os objetivos da descrição. Ou seja, são informações que não farão diferença nenhuma para a narrativa, não terão importância durante a aventura (nunca mais são citadas), ou ainda não trarão nenhum elemento novo para o cenário. Elas não contribuirão diretamente para a imersão dos jogadores. Não podemos confundi-las com a redundância, que é repetir, desnecessariamente, informações que realmente são importantes. As duas categorias de informações podem tornar a narração cansativa, mas informações irrelevantes podem até trazer complicações.
Na verdade, essas informações podem nublar a mente dos seus jogadores. Elas podem desviar atenção de onde eles realmente deveriam estar atentos. Além disso, informações irrelevantes podem fazer com que as relevantes deixem de ser. Pois uma vez que informações relevantes e irrelevantes são dadas sem intencionalidade, na mesma intensidade, elas todas estarão em uma mesma categoria: ou todas são importantes, ou nenhuma o é. Além disso, se essas informações são irrelevantes, elas não precisam estar na mente do jogador exatamente como estão na sua mente. Como eu sempre digo: deixe lacunas para seus jogadores preencherem.
Ambiente, infraestrutura e descrições
Quando falamos em descrições de cenários no RPG estamos abordando dois aspectos. O primeiro é o cenário como infraestrutura, como um local físico – uma taverna, uma sela, uma rua, uma floresta, etc. O segundo é o cenário como ambiente, onde existe sons, cheiros, texturas e sabores. Indiscutivelmente, as caraterísticas do cenário como ambiente são bem mais mutáveis do que a infraestrutura.
“Esta pequena taverna oval é feita completamente de madeira, com algumas poucas mesas espalhadas em seu salão principal. A 5 metros de altura, temos um mezanino; uma escada a oeste leva para o andar superior. Há também uma porta atrás de um balcão de madeira mofada, que leva para a cozinha da taverna. Quase nenhuma luz entra pelas janelas sujas. ”
Trecho retirado do texto: Tornando ambientes interativos em D&D 5e, de Artur Morales.
Todas as características que vemos nesta descrição falam do que os olhos são capazes de captar e estão diretamente relacionadas a infraestrutura do local. Mas com é o ambiente desta taverna? Há pessoas aí? Estão conversando? Deve haver sons de canecas batendo nas mesas, passos... E essa porta de madeira mofada? Somente através da visão as personagens seriam capazes de notar o mofo? E o cheiro? E como é a temperatura deste local? Neste ponto, se preciso, volte para a parte anterior: Evite informações irrelevantes.
Imagem: Tales From the Yawning Portal
Descrições com os sentidos
Muitas vezes, em nossas descrições no RPG, costumamos valorizar muito a visão, já que ela realmente é a que absorve mais informações imediatas. Alguns jogos, principalmente pelas características de algumas personagens, até pedem mais informações em diferentes sentidos, como um faro apurado, ou até mesmo um sexto sentido. Contudo, não podemos esquecer que possuímos 5 sentidos (ou mais) para explorar e enriquecer nossa narração.
Perceba que algumas descrições podem ser levadas de um sentido para o outro. É importante que contemplemos os diversos sentidos dos jogadores. Em uma mesa pode haver pessoas que se identificarão mais com certo cheiro, outras lembrarão muito bem de uma tal sensação. Além do mais, precisamos sempre lembrar que não são todas as pessoas que possuem os 5 sentidos funcionando em sua totalidade. Portanto, é de extrema importância estarmos aptos para expressarmos as informações de um ambiente de maneira acessível, usando diversos sentidos para descrevê-las.
Não precisamos descrever todas as cenas usando todos os sentidos. Mas podemos, em uma mesma descrição, usar vários deles. Por exemplo: eu poderia dizer que as personagens estão entrando em uma casa recém pintada sem dizer que “as paredes parecem recém pintadas”, por estarem impecavelmente brancas. Neste caso, poderíamos dizer que “o ambiente tem um cheiro forte de tinta”. Perceba que dou uma informação usando um sentido, o olfato, e o cérebro do jogador será capaz de olhar o ambiente como recém pintado. Assim, você pode criar uma experiência sensorial mais profunda e trazer ainda mais seus jogadores para dentro do cenário.
Descrições personalizadas
No meu último texto aqui no Blog da Torre do Dragão eu falei sobre Narrar One-shots. Dei dicas valiosas, principalmente para que você consiga gerenciar melhor seu tempo de sessão. Um dos aspectos que abordei foi a carência de tempo para trazer à tona características individuais das personagens. Sendo assim, aqui quero aproveitar para me aprofundar nas descrições que podem te ajudar a trazer essas características à mesa.
Observe quais aspectos das personagens dos seus jogadores podem ser usados nas suas descrições. Como eles perceberiam certas características daquele cenário levando em consideração as experiências que eles já tiveram? Alguém conhece um lugar como este? Ou está familiarizado com esses sons? Se um deles cresceu longe dos pais passando fome e frio pelas florestas, em qualquer situação de fome e frio você pode usar seu passado para descrever quais sensações ele poderia ter naquela cena.
Neste ponto, quero deixar um alerta! Há alguns jogadores que se incomodam em ver o narrador ou a narradora descrevendo o que sua personagem estaria sentindo. Para evitar problemas com isso, descreva a cena e ofereça ao jogador a oportunidade de complementá-la, se ele quiser ajustar algo. Por outro lado, há outros jogadores que adoram ver suas personagens ganhando vida nas palavras do mestre. Então a máxima aqui é:
Conheça seu grupo de jogadores.
Começamos com os princípios básicos de boas descrições, que deve evitar informações redundantes e irrelevantes. Por fim, além da prática, o que sempre melhora nossa narração é conhecer o grupo de jogadores.
Cada mesa é diferente da outra, porque cada jogador é diferente do outro. Conhecer bem sua mesa fará com que você saiba quais tipos de descrições funcionam melhor para ela. Saber se seus jogadores são mais objetivos, pode te ajudar a balancear as descrições no RPG com mais objetividade.
Em uma campanha isso vai acontecendo no decorrer das sessões. Saiba observar seus jogadores. Esteja atento ao que funciona melhor. Assim poderá sempre aprimorar suas habilidades narrativas.
E mais uma vez, o Repertório.
Em meu primeiro texto eu falei sobre experiências que podemos usar para melhorar nossas interpretações. Mas vale também para narrações. É de repertório que a gente precisa para melhorar. Nenhuma dessas dicas terá sua aplicação automática e nem te tornarão um super mestre. E, principalmente, nenhuma delas será totalmente aplicável se você não tiver repertório. E para acumular repertório de descrições, leia! Leia para aprender novas palavras, novas maneiras de se expressar, novas formas de descrever. A leitura é o melhor alimento do mestre e ela deve ser uma importante fonte de recursos para melhorar suas capacidades narrativas.
Então, já quero te agradecer pela leitura até aqui!
Gostou das dicas? Me conta quais suas fontes de inspirações para melhorar suas descrições no RPG. Eu vou adorar saber!
Obrigada pela leitura e até a próxima!